Desobrigada

A terapeuta interrompeu meu relato. “Então, o melhor dos bons encontros desta Flip foi o encontro com você.”. Ela não perguntou; ela afirmou. Concordei, meio sem pensar, porque a fala encaixou, vestiu e serviu sem folgas ou apertos.

Havia um bocado de encontros marcados para a Flip deste ano. Muitas amigas virtuais, dos movimentos feministas, dos literários. Queria ver todas, conversar com todas, tomar café com todas. Tentei uma agenda intensa de mesas a assistir, não só na programação principal, como nas várias casas parceiras espalhadas pelo Centro Histórico. Tinha os cinco dias de evento para fazer tudo.

Só que não. Não deu. Nada. Ou quase nada.

Não dei conta de mim, muito menos da agenda, dos encontros marcados, dos compromissos assumidos. Tive de deixar a fluidez protagonizar os meus dias e cedi à necessidade de andar, ver uma pessoa ou outra ao acaso, pelas ruas (ainda bem que estou acostumada às pedras e não preciso caminhar com os olhos no chão).

Antes de pegar a estrada já percebia que a alma clamava por repouso, porém ainda acreditava no fôlego para as obrigações a que costumo me impor. Diferente de todos os anos, a palavra de ordem teve de ser “desobrigação”. Caso contrário, deveria arrumar as malas e voltar correndo para o meu sofá.

Paraty sempre foi meu refúgio. Mesmo durante a Flip, quando abraço uma agenda intensa, a cidade também me abraça e me integro ao ambiente, ao clima, às pessoas. No entanto, tive que olhar apenas pra dentro, respirar sentindo cada célula, zelar pela segurança emocional, prestando atenção a cada movimento, cada desejo. A mente passeou várias vezes, no decorrer de uma mesa ou de um papo em casa, num almoço ou café. Em diversos momentos estava entre as árvores da Praça da Matriz, pairando sobre o mar, boiando no rio, enquanto a realidade acontecia a minha volta.

Sobre a programação principal, à qual dedico mais tempo, a mesa que me derrubou o queixo foi “A santa e a serpente”, sexta à noite, com Eliane Robert Moraes e Iara Jamra, seguida de “Obscena, de tão lúcida”, com Juliano Garcia Pessanha e Isabela Figueiredo.

Comprar livros na livraria da Flip continua sendo uma varada n’água. Os preços são escorchantes. Vale apena olhar, pesquisar, anotar o que interessa e comprar depois. Como de costume, adquiro uma edição especial e pronto. Adquiri alguns títulos em espaços alternativos, de autores independentes e editoras pequenas. Há muita gente boa fora do circuito badalado.

Acho que é só isso. Sem obrigação.

 

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